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Benefícios terapêuticos das plantas vão além do alívio

Os benefícios terapêuticos proporcionados pelo contato com as plantas podem ir além do simples alívio do cotidiano desgastante das grandes cidades.
    
“O que precisamos é de uma injeção de flores.” A afirmação é de uma das pacientes do projeto Plantando Sonhos, desenvolvido pela psicóloga Cláudia Silvana Cardoso de Azevedo no Instituto de Psiquiatria da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
    
O projeto usa a jardinagem como forma de tratamento para distúrbios mentais como esquizofrenia e psicose e teve apoio e acompanhamento da psiquiatra Nize da Silveira (1906-1999), pioneira na busca por novas terapias para usuários de serviços de saúde mental e fundadora do Museu de Imagens do Inconsciente, no Rio de Janeiro. “Esse tipo de trabalho desperta a auto-estima, desenvolvendo a relação com o outro”, afirma.
     
Em artigo publicado na newsletter “American Horticultural Therapy Association”, Azevedo afirma que, quando o participante da oficina tem preocupação em cuidar do seu canteiro, está indiretamente se auto-cuidando e descobrindo a sua capacidade de criar vida.
     
“Quando comecei a trabalhar com a Nize da Silveira, vi que existiam outras possibilidades de trabalho que não eram verbais. Temos percebido que os integrantes já conseguiram maior autonomia nas suas relações interpessoais, tornaram-se mais participativos e sabem lidar melhor com suas dificuldades nas situações cotidianas”, afirma a psicóloga.
    
Um trabalho semelhante foi desenvolvido dentro do projeto Cada Doido com Sua Mania, coordenado pela psiquiatra e psicanalista Tânia Mara Prates, professora do departamento de Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo. Em 2002, o projeto desenvolveu uma oficina de jardinagem terapêutica com crianças com transtorno mental grave em um canteiro coletivo dentro da universidade.
     
“A responsabilidade de cada paciente com as plantas, a manutenção do jardim e o uso das ferramentas produzem um caráter terapêutico que poderá interferir na forma de ele lidar com os cuidados pessoais e com a capacidade de entendimento social”, afirma a médica.
    
Durante a prática, a dose certa do cuidado também era colocada em questão: “Crianças muito afobadas colocavam muita água e acabavam machucando a planta”.
    
O Projeto Crescer, que oferece aulas de capacitação profissional em jardinagem para jovens de baixa renda no parque Tenente Siqueira Campos (Trianon), é outro exemplo de como o jardim pode ser usado como meio de integração social. Essa semente foi plantada há dez anos pela bióloga Assucena Tupiassu, quando coordenava a Escola de Jardinagem do parque Ibirapuera, em São Paulo –cuja fila de espera chega a durar mais de um ano.
    
“Nos arredores do parque, havia muitas crianças que tomavam conta dos carros e ficavam o dia inteiro sem fazer nada. Começamos a oferecer oficinas de jardinagem”, afirma a bióloga. Como as plantas, as crianças foram crescendo, e Assucena resolveu criar o curso profissionalizante com duração de um ano.
     
“É possível aprender muito com as plantas. A gente se coloca na situação delas, entende a planta e se entende também. Eu gosto muito do bambu, que é flexível, pode ir até o chão numa tempestade, mas nunca quebra.”
    
Do hobby às terapias, novos adeptos descobrem a jardinagem
    
Enquanto a primavera desponta, novos adeptos da jardinagem surgem qual maria-sem-vergonha na cerca. Em pequenos ou grandes espaços, em apartamentos ou ao ar livre, os jardins ganham atenção especial e funções mais diversificadas: meditação, gastronomia, relaxamento, sociabilidade.
    
Além de ser um hobby cada vez mais procurado, o cuidado com as plantas e flores pode colher múltiplos resultados: do tratamento de distúrbios mentais –como mostram projetos desenvolvidos nas universidades federais do Rio de Janeiro e do Espírito Santo– ao relaxamento obtido em spas –que apostam em jardins exuberantes para atrair mais hóspedes.
    
De acordo com Teodoro Henrique da Silva, diretor da maior feira de negócios da área, a Fiaflora Expogarden, que chega à sua oitava edição no início de outubro, o crescimento do setor gira em torno de 15% e 20% ao ano. “A diversificação de produtos e serviços aumentou bastante. Neste ano, vamos realizar pela primeira vez um encontro entre empresários da América Latina e da Europa”, afirma Silva.
    
Para o arquiteto Eduardo Barra, presidente da Abap (Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas), o mercado está em “total expansão”. “Trabalho há 31 anos na área e nunca assisti a um fenômeno como esse”, afirma Barra, que atribui esse crescimento gradativo a três fatores: a progressão da consciência ecológica da população, a legislação ambiental brasileira, “cada vez mais criteriosa e mais exigente em relação à preservação” e o interesse econômico da classe empresarial. “Isso passou a ser um assunto. As pessoas trocam mudas de plantas”, afirma. Ele acredita que, atualmente, os jardins em espaços pequenos são o grande desafio para a maior parte dos paisagistas.
    
SPA – Além dos banhos, das massagens, das dietas e dos exercícios tradicionais, as flores também estão ganhando lugar de destaque em alguns spas de São Paulo.
    
Localizado a 87 km da capital paulista, o spa Fazenda Iguaratá oferece aulas de técnicas de reflorestamento em uma área de dois alqueires e meio de mata atlântica preservada e mais um alqueire e meio de espaço reflorestado.
    
“É uma forma de as pessoas desestressarem, de interromperem o cotidiano e voltarem a atenção para si mesmas”, afirma o biólogo Lito Fernandes, 39, gestor ambiental do spa, que orienta os visitantes na produção de mudas feitas em duas estufas. Depois, as plantas são levadas para a área de reflorestamento, para os jardins ou para uma horta orgânica. Uma terceira estufa abriga as ervas medicinais.
    
Segundo ele, a maior parte dos hóspedes mora em apartamentos e nunca teve contato com a terra. “Explicamos como adequar o solo, como escolher a terra, a profundidade em que se põe a semente ou a muda. Tem gente que descobre esse lado jardineiro e vem ao spa só para participar dessas atividades”, diz o biólogo. Na volta, os hóspedes ganham um kit de sementes e vasos para levar para casa. “É uma forma de estimulá-los para que eles cultivem isso também na cidade”, diz Fernandes.
    
Inaugurado no começo deste ano, o megaempreendimento Unique Garden (entre Atibaia e Mairiporã, a 50 km de São Paulo), também utiliza seus 300 mil m2 ajardinados como atrativo.
    
“O lugar é basicamente composto por jardins. O impacto visual é muito grande”, afirma o engenheiro agrônomo Fernando Lima Lopes da Cruz, que organiza visitas monitoradas às estufas do spa, onde são ensinadas as técnicas da produção das flores que abastecem os viveiros locais.
    
Há ainda um orquidário, três estufas para o cultivo de hortaliças e duas hortas externas com produção orgânica, um ervanário com 200 espécies de plantas medicinais e um jardim com ervas condimentares.
    
A procura por condimentos e ingredientes frescos levou o chef Carlos Siffert, 39, a fazer seu próprio jardim de ervas no terraço de seu apartamento, na região central de São Paulo, onde cultiva tomilho, orégano, alecrim, melissa e manjerona em grandes vasos de barro.
    
“Não sou jardineiro, então tenho plantas fáceis de cuidar. Mas, às vezes, insisto em algumas ervas menos persistentes, que são muito difíceis de achar no comércio”, diz o chef.
    
Uma delas é o cerefólio, uma erva aromática com a aparência de uma “salsinha em miniatura”. “Ela é usada para finalizar certas receitas. Tem um sabor bem delicado e serve para decorar pratos com peixe e saladas. Como não é picada nem cozida, vai praticamente do vaso para o prato”, afirma o chef, que nunca teve queda pela jardinagem, mas, por conta das ervas, ficou mais próximo da terra. “Todo dia dou uma olhadinha de uns 15 minutos. E o ato de colher as ervas já serve como uma poda.”
    
Jardins são usados como locais de meditação e reflexão
    
Do Éden, onde Adão e Eva cometeram o pecado original à sombra de uma macieira, ao Getsêmani, em que Judas entregou Jesus aos guardas com um beijo fatal, os jardins remetem a muitas metáforas no universo religioso. E não só na tradição judaico-cristã.
    
“Se a vida é um jardim, o melhor jardineiro é o zazen [ato de sentar para meditar]”, filosofa Monja Coen. De acordo com a monja zen-budista, no Japão existem os chamados jardins zen, que são usados como local de reflexão e meditação –e também são recorrentes na literatura budista. “São geralmente jardins com pedras que podem ser deslocadas. O principal atributo deles é trazer a tranqüilidade e uma idéia de simplicidade”, afirma a monja, que passou 19 anos de vida monástica no Japão, onde os jardins também têm papel fundamental na cerimônia do chá.
    
O paisagista e biólogo nissei Hissachi Kura-shima, 39, explica que muitas vezes os arranjos orientais fazem microrrepresentações de elementos do mundo natural, como montanhas, lagos e cachoeiras. “Tem o mesmo sentido do bonsai, de trazer uma árvore para dentro de casa. Utilizamos também plantas que representam bem a estação do ano, para lembrar a passagem do tempo”, diz Kurashima.
    
Segundo ele, a idéia é levar a harmonia e o equilíbrio para dentro de casa, para que o homem entenda que ele faz parte da natureza e não o contrário. “É a gente que está invadindo as florestas e o verde. Eles são maiores”, diz.
     
Imbuído desse conceito, o contador Fernando Giarini Fontes, 39, resolveu fazer um jardim japonês no quintal da sua casa para a prática da meditação, há aproximadamente um ano. “Toda meditação traz a idéia de integração com a natureza”, afirma Fernando, que medita pelo menos uma hora por dia.
     
“O jardim motiva a meditação, é um lugar gostoso. Tenho uma sensação de liberdade e unidade. Saio da confusão do dia-a-dia.”
     
O uso da jardinagem como um hobby relaxante talvez seja um dos mais procurados. Todo fim de semana, a cirurgiã plástica paulistana Loriti Breuel, 49, foge para sua casa de campo no interior de São Paulo, onde passa a maior parte do tempo entretida com as plantas no quintal. “O que eu mais curto é cuidar do pomar. Adoro chupar laranja no pé. Às vezes, fico horas falando com as plantas. Encontro ali uma estabilidade emocional”, diz a médica.
    
Da Assessoria de Imprensa do Cremepe.
Com Informações de MARCOS DÁVILA.
Da Folha de São Paulo.